terça-feira, 30 de outubro de 2012

Aula na pós Fotografia - UCAM 2012


Mais uma vez tive o prazer, neste mês de Setembro de 2012, de dar aula no curso de Pós-Graduação Lato Sensu Fotografia - Imagem, Memória e Comunicação, da Universidade Candido Mendes – Rio de Janeiro, coordenado por Andreas Valentin. 
O curso é basicamente o mesmo que foi criado em 2001 por Milton Guran, sob o título "Fotografia como Instrumento de Pesquisa nas Ciências Sociais", e que, com a mudança de foco e de nome, tem hoje alunos de diversas origens e motivações profissionais, tanto fotógrafos e cientistas sociais quanto historiadores e publicitários.

Pós Fotografia UCAM, turma 2012 - foto Aguinaldo Ramos
[com minhas desculpas a quem ficou fora da imagem...]
A aula compreendeu uma espécie de síntese dos temas deste blog A Foto Histórica no Brasil e da série de blogs A História bem na Foto, base da dissertação de mestrado A História bem na Foto: fotojornalistas e a consciência da história, apresentada em Julho de 2008 ao PPGHC – Programa de Pós-Graduação em História Comparada, do IFCS - Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, na UFRJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro.
E, ao mesmo tempo, uma notícia interessante: uma nova linha de pesquisa, relacionada à Imagem e à Fotografia, acaba de ser criada dentro do Programa de Pós-graduação em Sociologia do IUPERJ, ligado à própria UCAM, intitulada "Imagem, Memória Social e Patrimônio Cultural", em mais uma evidência da importância da imagem nos estudos sociais. As inscrições para este Mestrado estão abertas até 20 de Novembro.

quinta-feira, 21 de junho de 2012

A foto não erótica do corpo feminino

O lado menos espetacular da revolução feminina talvez seja a exposição não erótica do corpo feminino, algo que se tornou bem recebido e mais comum nas fotografias brasileiras na mesma época em que lá nas batalhas culturais do Primeiro Mundo as feministas queimavam sutiãs... 
Topless "protegido" em Ipanema - Aguinaldo Ramos, c. 1982

Aqui no Brasil não houve nada disso e a confusão provocada, nos anos 70, pela tentativa de popularização do "topless", que não deu certo, mostra bem a predominância entre nós de um conservadorismo machista básico, que facilmente se misturava, nas atitudes masculinas, à mais baixa ignorância. Custou belos gestos de despreendimento de algumas mulheres corajosas, atacadas a golpes de punhados de areia em muitas praias do país, a começar pela “avançada” Ipanema.

Índia paraense - George Huebner

Fotos de índias com seios expostos, apesar do quanto alimentavam o voyeurismo, eram aceitas como "objetos antropológicos”, pois, afinal, se tratavam de grupos sociais não integrados à sociedade “civilizada”, tanto que não tinham, até então, expressão própria (no sentido de lhes faltarem meios para construir uma autoimagem). Um bom exemplo está no livro “A fotografia amazônica de George Huebner”, do fotógrafo e pesquisador Andreas Valentin.

Foi pelo viés da maternidade que esta "renaturalização" do corpo feminino se deu, até quanto é possível afirmar isto... E não tanto pelas imagens fotojornalísticas e mais pelo valioso propósito, que dele não passavam de acessório. 

Joel Maia, 1971 - Leila Diniz grávida
O primeiro grande "choque de intimidade feminina explícita" na fotografia brasileira está ligada à “sagrada” imagem da maternidade, ainda que haja poucas santas grávidas no panteão cristão... E foi uma rebelde, em tempos de ditadura, quem (se) descobriu (n)esta causa. Leila Diniz, um tempo depois de todos os asteriscos (mal disfarçados palavrões...) de sua abaladora entrevista ao Pasquim, quando devidamente recolhida em defesa de sua prole (ainda não nascida), na sua naturalidade de fêmea, não estranha a proposta e, solta em seu barrigão, posa para fotos na ilha de Paquetá..

A repórter Maria Helena Malta, em depoimento ao autor, explica porque saiu apenas uma pequena nota: "A revista Claudia só publicou as fotos porque eram, digamos, maternais, e foram misturadas com as histórias de duas mães recentes – Nara Leão e Dina Sfat. (...) É isso: a Leila (hoje tão imitada por mulheres "bem-comportadas", que já dispensaram a bata do maiô e usam biquíni na gravidez) foi uma desbravadora, cuja aura rebelde o nosso Joel foi capaz de eternizar."
Amigas do Peito - Antonio Batalha, Ipanema, 1982

Mas, à época, a partir da mesma Ipanema, mulheres menos famosas não ficaram atrás... Maternalmente satisfeitas, sabiam da necessidade de satisfazer suas crias, e não com leite em pó, embalado em publicidade despudorada. Seus corpos também podiam ser usados numa campanha sempre sabotada pela indústria: a favor da amamentação natural. Assim surgiram as Amigas do Peito, que são, antes de mais nada, amigas dos próprios filhos...
Lucélia Santos e Pedro Neschling - Elisa Ramos, 1982

A fotógrafa Elisa Ramos estava entre elas, fotografando as amigas mas também defendendo a causa, quando aparecia amamentando o filho Rudah (a 2a. à esq., na foto). Uma campanha acalentada também por celebridades, como as que Elisa registrou.

Ângela, Chácara do Céu - Elisa Ramos, 2012
Sendo o assunto de tão continuada utilidade, tantos anos depois, retornou ao tema de forma socialmente mais abrangente, fotografando as mães de uma das maiores favelas do Rio de Janeiro e apresentando lá mesmo, as fotos montada em grandes painéis, na exposição Leite de Mãe, Leite de Vida, uma das ações do programa Mãe de Perto do SESC, aberta até 30 de julho, na Estrada da Independência, Morro do Borel, Tijuca.

Xavante amamentando na aldeia 
William Santos, 1995
Ressalte-se que, influenciado pela espontânea exposição destas mães, um necessário posicionamento dos órgãos de governo, em campanhas e outras iniciativas, também aconteceu.

Extração Manual 1 
William Santos, 2001 (*)
Um bom exemplo é a atenção dada pelas maternidades públicas, como a da UFRJ, a partir da qual um dos seus fotógrafos, William Santos, tem também produzido, desde os anos 90, sucessivas exposições sobre o tema, com o título geral de AmaMentAção.

Mas, os fatos do momento trazem outra vez a questão: será que esta “redoma” da maternidade é realmente o único espaço de não erotização da imagem fotográfica do corpo feminino?...
Recentemente, um novo fenômeno visual ganhou força, o uso do corpo nu como instrumento de luta em causas sociais, econômicas ou políticas, recurso que também é válido para a mera tentativa de atrair atenção, como os inúmeros torcedores “peladões” que invadem campos e quadras europeus...

Mulheres mostram seios em protesto contra Rio+20
Sérgio Moraes, 2012
Pois um dos mais insistentes grupos a utilizar esta arma surgiu na Ucrânia, onde mulheres jovens fazem, de peito aberto e visível, os mais ferrenhos protestos. Custou um pouco, mas a onda já chegou ao Brasil e um grupo de mulheres teve peito de protestar, de seios à mostra, contra a inocuidade da Rio+20 no enfrentamento dos problemas ambientais do mundo.
Chamaram a atenção, mas fica a dúvida: será que ganham respeito, acrescentam valor à causa?... Pois, de imediato (e muitos veriam nisto uma prova da capacidade de absorção dos protestos por parte do sistema), umas das mais bem torneadas manifestante, segundo o colunista Anselmo Goes, foi sondada para posar nua para a revista Playboy...

[ (*) Imagem acrescentada em 27/07/2012 . 
Veja nos Comentários os motivos da  atualização.]

segunda-feira, 28 de maio de 2012

Histórias subterrâneas do Metrô do Rio


Convite Exposição SUB - CCJF - Rio de Janeiro, 2012
A História tem histórias subterrâneas, nem todas são tão visíveis quanto estas...

É bem o que pode ser visto na exposição SUB, do fotógrafo Marcelo Carnaval, com fotos atuais das instalações e dos usuários do metrô do Rio de Janeiro, aberta no Centro Cultural da Justiça Federal até 1 de Julho de 2012. 







Foto Marcelo Carnaval, expo SUB - CCJF - Rio de Janeiro, 2012
A estética das estruturas é imperativa, é claro. 
Carnaval trata disto muito bem, mas não deixa de integrar a elas as pessoas, que são, evidentemente, os protagonistas. Cristina Chacel, no convite, ao apresentar a exposição, esclarece como o autor consegue tal integração: “A sub-cidade de Carnaval floresceu em gente. (...) É cidade que submerge para emergir em encontros, carnavalizada pelo artista que extrai alma da pedra bruta e brinca de fazer luz”.
Foto Marcelo Carnaval
Expo SUB - CCJF - Rio de Janeiro, 2012 


As imagens de Marcelo Carnaval não só abriram novas percepções estéticas (e até práticas) em relação ao Metrô do Rio, como me provocaram um "choque de memória": tornou-se necessária uma ida aos meus (também subterrâneos) arquivos (caixas e caixas de papel fotográfico e de plástico ondulado, com recortes de revistas e jornais, cartelas de negativos ou slides e fotos copiadas em diversos tamanhos) para a recuperação de uma matéria sobre a inauguração do primeiro trecho do Metrô, que lembrei ter feito para a revista Manchete, no distante ano de 1979...









Não achei justamente a abertura (o título e créditos), mas lá estavam as páginas amarfanhadas, com uma anotação a caneta: “Manchete # 1386”. A edição da revista deu ênfase aos seus interesses da época, com várias fotos de três temas: as instalações do metrô, "elogiadas pelo próprio presidente francês Giscard d'Estaing", a reurbanização da cidade, depois de demoradas obras, e a presença pouco habitual do presidente Ernesto Geisel, em versão quase populista...

Faz-se de tudo, mas lembro que o grande desafio (em termos fotográficos) foi “calibrar” a cor da luz nas fotos de interiores. Era um novo tipo de iluminação (a cada hora lançavam um novo tipo de lâmpada) e, para corresponder à percepção comum (ou, na verdade, às exigências meio neuróticas dos editores, que sempre queriam todas as imagens “equilibradas”), e dadas as limitações da época (o uso de slides, que não permitiam correções posteriores), era necessário fazer a filtragem da luz, corrigir o seu desvio para azul e/ou verde, nem sempre com resultados muito exatos... 

Estação Cinelândia - revista Manchete - abril, 1979 - foto Aguinaldo Ramos 


Um problema, para a revista, semelhante ao do desfile de Carnaval (o outro, não o nosso fotógrafo...), cujas luzes também precisavam ser corrigidas. Lembro qualquer coisa de usar uma combinação dos filtros magenta e amarelo (20% de um, 30% de outro, por aí), tanto em um quanto no outro caso. 
Visor prismático
Capuchão
Ou, quando não disponível o filtro exato, apelava-se para um recorte redondo da folha de gelatina correspondente, que era aplicado artesanalmente entre o filtro UV (comum) e a lente da câmera 35mm, à época uma Nikon F2 de visor prismático removível (a “cabeça” da câmera), à qual se podia acoplar um “capuchão” para facilitar o enquadramento da imagem por cima, ao estilo das Rollei Flex e Hasselblads.



O difícil da História (quando falamos daquela em que se está) é vê-la em movimento... 
A lembrança dos primórdios ou a observação do contemporâneo, no Metrô do Rio, não pode desviar nossa atenção do que acontece agora e do que se pode imaginar que vem por aí, basta apenas projetar para o futuro algumas das fotos de Marcelo Carnaval. 


Foto Marcelo Carnaval - Expo SUB - CCJF - Rio de Janeiro, 2012




Fato é que, desde a “invenção” da ligação direta da Linha 2 com a Linha 1 na Central, a óbvia proposta de um metrô em rede foi desprezada. Pelo que está acontecendo na operação (as paradas e os riscos) e pelas obras de extensão que estão sendo feitas (a emenda de uma falsa Linha 4 a partir da estação Ipanema), esta desconfiguração do Metrô, segundo especialistas, será conhecida no futuro como um grande erro histórico. 
Foto Marcelo Carnaval - Expo SUB - CCJF - Rio de Janeiro, 2012



Os que tomaram estas decisões inconsequentes têm esta vantagem: quando (e se, é claro) a História confirmar a previsão de um Metrô cada vez mais angustiante e insuportável, já não estarão mais no poder...