sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Questão de consciência: o negro na fotografia brasileira

João Cândido

Glória a todas as lutas inglórias 
que através da nossa História 
não esquecemos jamais



As comemorações do centenário da Revolta da Chibata, com homenagens ao Mestre Sala dos Mares João Cândido, o Almirante Negro, traz à tona a presença do negro na fotografia brasileira.
Ocorrida em 1910, a Revolta da Chibata teve considerável cobertura fotojornalística, apesar das limitações políticas e técnicas (saiba mais nos links).
 
Na foto, publicada pela revista O Malho em 27 de Novembro de 1910, a bordo do encouraçado Minas Gerais, João Cândido lê os decretos presidenciais de abolição dos castigos físicos na Marinha e de anistia aos revoltosos, tendo à frente o Cmte. Pereira Leite, que aguarda a devolução do comando.

João Cândido discute anistia com Pereira Leite - O Malho, 1910
Anistia que foi desconsiderada logo em seguida pelo governo de Hermes da Fonseca, transformando-se em prisões, desterros e mortes dos marinheiros.

 No detalhe, o fotógrafo flagrado no lado errado do lance... 
Note-se, além da elegância do seu traje, o tamanho (e imagine-se o peso) do equipamento fotográfico. Seria, pelo tipo físico assemelhado, Augusto Malta, autor de importantes registros do episódio?...
Tratados com uma violência escravocrata, os marujos, negros na sua grande maioria, para surpresa da sociedade de então, demonstraram uma alta competência, da organização do movimento ao comando dos mais modernos navios de guerra da época.

Os registros fotográficos da Revolta da Chibata dão uma dimensão realista às relações sociais e étnicas do momento, mas a atitude escravocrata também persistia na imprensa, que estampou diversas alusões de cunho racista contra as lideranças do movimento. 
Por exemplo, na capa da revista Careta, o que seria a resultante “inversão de papéis”: marinheiros brancos, descalços e subservientes, sob comando de oficial negro, com traços forçadamente simiescos.




Este, justamente, um dos temas da palestra do pesquisador e colecionador George Ermakoff, autor do livro O Negro na Fotografia Brasileira do Século XIX, na biblioteca do Centro Cultural da Justiça Federal (Rio), no dia 23/11/2010, por conta das comemorações da Semana de Consciência Negra.
O editor George Ermakoff, ladeado por Cristina Paiva (biblioteca CCJF) e Tom Farias Alves (biógrafo do poeta Cruz e Souza, do abolicionista José do Patrocínio e da escritora Carolina Maria de Jesus).
No século XIX, antes da Abolição, a fotografia dava às pessoas negras, predominantemente, um tratamento de figuras exóticas, transformando as imagens dos diversos tipos físicos negros em um produto comercial, que, interessando especialmente a estrangeiros, se tornou um bom negócio para os fotógrafos, que os fotografavam em seus estúdios.


Escravo Mina - Cristiano Jr, c. 1865
Usando as imagens de seu livro como referência, Ermakoff falou do comércio de fotos de negros brasileiros, vendidas a varejo como cartões postais, especialmente as de Cristiano Jr, na década de 1860 no Rio de Janeiro.



Escravo Mina Ossa, Augusto Stahl,1865














Mas, também, do uso pretensamente científico destas fotografias. 
Negra vendedora - Alberto Henschel, 1870


Coleções delas foram parar em instituições americanas, como as de Augusto Stahl (alemão, no Brasil entre 1853 e final dos anos 60), que o pesquisador Luiz Agassiz levou para Harvard, EUA, ou as de Alberto Henschel (alemão, entre 1866 e 1882 teve estúdios em Recife, Salvador, Rio de Janeiro e São Paulo), que foi levada em quantidade para museus alemãs, de onde Ermakoff os resgatou para seu livro.



Mas faz muito tempo...

.
 (O Mestre Sala dos Mares
Aldir Blanc e João Bosco)

20 comentários:

Terezinha Costa - jornalista disse...

Olá Aguinaldo,
acabo de conhecer seu blog, que li com muito prazer. Vou virar seguidora.
Terezinha Costa

Elisa Ramos disse...

Aguinaldo, em 2006 (se não me engano...) o fotógrafo Januário Garcia fez uma bela exposição sobre a presença do negro na fotografia brasileira, no centro do Rio, ali no Buraco do Lume - ele pode te falar mais sobre isso e mostrar essas fotos. Bjs

Leticia Coimbra disse...

É show! Acabo de tuitar sua foto. Excelente trabalho!

Ricardo Ruiz disse...

S e n s a c i o n a l !

Aguinaldo Ramos disse...

Tem toda razão, Elisa.
No que se refere à presença dos negros na fotografia (e mesmo como liderança do Movimento), o Januário é mesmo o cara!
Basta dizer que é autor do livro “1980/2005 — 25 anos do Movimento Negro no Brasil”...
E tem outro livro... excelente, com texto do antropólogo Júlio Tavares, sobre os afrodescentes nos países da América do Sul, que resultou na exposição “Diásporas Africanas na América do Sul: Uma Ponte sobre o Atlântico”, que estave até fins de Outubro no SESC Tijuca.

Luiz Antonio Bandeira disse...

Super!
Tá DEMAIS!!!! as inserções fotográficas do Negro na historiografia brasileira!
Trabalho estupendo, fenomenal!
Estás DEFINITIVAMENTE inserido como um dos Pais da fotografia contemporânea mundial! Que viagem acabei de realizar!
Band.

Marcos Vinicio Cunha disse...

Tá otimo o blog!
abs, Marcos.

Cleusa Meurer disse...

Oi Guina Ramos, saudades !!!!
Então, fazendo palestras, correndo no mundo da fotografia.
Adoro teus textos, vai escrever bem assim... lá na China, rapaz!

MEMÓRIAS CAMINHADAS disse...

Guina,
a cada postagem você me surpreende mais.Gostei muito da informação,da capa da Revista Careta.
Parabéns!!!!
Beijos
Márcia Hortência

Marcelo Bonavides disse...

Prezado Aguinaldo,
Quero agradecer aos incentivos e dicas para meu blog "Estrelas Que Nunca Se Apagam".

As fotos de Rose Villiot, Clélia de Araújo e Ana Manarezzi são de livros que eu possuo. A foto de Pepa Delgado pertence ao meu arquivo e me foi doada pela própria neta da cantora.

Eu ainda estou aprendendo muita coisa com photoshop. As assinaturas designam apenas a procedência do arquivo de onde eu as tirei. Já publiquei várias fotografias sem essa marca d´água e muitas delas foram usadas em outros sites sem que mencionassem a fonte. Por isso eu as uso. Eu tenho autorização do Arquivo Nirez para postar arquivos e também faço questão de colocar a fonte na própria foto. Ainda estou tentando aprender como melhorá-las.
Gostei muito de seu blog A Foto Histórica (e suas histórias) no Brasil. Seria um prazer trocar idéias com você.

Obrigado,
Atenciosamente,
Marcelo Bonavides

Aguinaldo Ramos disse...

Muito grato, Marcelo, pela presença e pelo comentário.
Queira me perdoar se fui impertinente ao comentar o seu excelente blog Estrelas Que Nunca Se Apagam, http://bonavides75.blogspot.com/...
Se você decidiu ter seu crédito de colecionador impresso na imagem, sugiro utilizar o recurso “marca d’água” (quase transparente) do Photoshop, que deixa a imagem quase íntegra e não pode ser retirado. O texto volumoso que você usa prejudica muito a visualização da fotografia, que é uma pena.
Como as fotos estão em baixa definição, não têm utilidade para impressão em papel, o que já restringe o uso comercial.
Quanto ao uso sem citação da fonte na internet, coisa muito frequente, vejo nisto (uma opção pessoal) uma (relativa) oportunidade. Com uma pesquisa periódica pela imagem, encontra-se quem copiou, e isto até pode resultar em um contato útil. Em geral, basta notificar e abrir um diálogo para se obter o reconhecimento da fonte.
Creditar imagens deve ser uma prática geral, o que nem sempre acontece por conta da própria dinâmica do trabalho e o acúmulo de tarefas. Você mesmo não cita a fonte das que “são de livros que eu possuo”....
Mas, a ênfase não deve ficar nos problemas. Mais importante é destacar o seu belo (e, para mim, inesperado) trabalho de pesquisa, meus parabéns!

Sandra Moura disse...

Mui legal
Bjs
Sandra Moura

Elisa Ramos disse...

Belo trabalho, Aguinaldo.

ELISA RAMOS
Fotógrafa / Jornalista
E-mail: elisaramosdivulga@yahoo.com.br
Tel. 21 - 2268.1492 (Skype: Elisa.Ramos34)
Cel. 21 - 8164.5753
Rio de Janeiro - Brasil

Marcelo Bonavides disse...

Olá!
Te agradeço mais uma vez as dicas. Vou procurar melhorar sim as marcas d´águas. Eu coloquei o nome dos livros no próprio blog, ao final do artigo. Inclusive meu livro-reportagem, que foi a monografia de conclusão de curso.
Grande abraço,
Atenciosamente
Marcelo

Aguinaldo Ramos disse...

Tem razão, me desculpe, o crédito das fontes está lá.
É que vc usou o padrão acadêmico, bibliografia ao final, e na hora de escrever meu comentário estava olhando apenas a área das fotos.
Vi que vc repetiu o início desta conversa nos comentários do seu blog. Fique à vontade, caso queira, para repetir os meus.
Abs,
Aguinaldo

Marcelo Argolo disse...

Valeu, Guina! Gostei do seu post sobre a revolta da Chibata e sobre o negro na Fotografia. Depois vou conferir os outros mais atentamente.

Aguinaldo Ramos disse...

Márcia Olímpio, viu no blog o fotógrafo, na foto da Revolta da Chibata?
Até sugeri, meio de brincadeira, que fosse Marc Ferrez, mas não tenho ideia. Depois li que o Malta tb cobriu e, comparando com a figura dele, achei parecido...
Mera curiosidade: vc, que é especialista nele, acha possível?

Márcia Martins Olimpio disse...

Oi, Guina
Parabéns pelo trabalho no blog 'Questão de consciência: o negro na fotografia brasileira'. Vi e gostei muito!
Logo que vi a imagem, eu também achei o fotógrafo parecido com o Malta, pelo tipo físico e pela a elegância característica. Como ele era o olhar oficial e do cotidiano do Rio, e estava sempre presente para registrar todos os eventos, acho bem provável ser ele.
(*) Sou apaixonada pelo trabalho do Malta, mas especialista... ainda não... rsrsrs...
Bj, Márcia.

Aguinaldo Ramos disse...

Para mim, já é a palavra de uma autoridade, esta sua quase certeza...
A situação é muito interessante, não? Gostaria de pesquisar sobre, mas não sei se vai dar.
Se tiver algum dado, me passa, ok?

Anônimo disse...

Algum de vocês poderia me ajudar ?
Eu descobri recentemente que fui colega do George Ermakoff na década de 50 no colégio "Ïnstituto Imperial"
em Petrópolis.
Gostaria muito de entrar em contacto com ele.
Jose Luiz Moreira Garcia
drvinagrephd@hotmail.com

Obrigado


Jose Luiz