Embora o senso comum tenda a ver como “realistas” as chamadas “imagens técnicas” (aquelas obtidas com o uso de algum equipamento entre o “apertador do botão” e a “realidade”, como fotografia e vídeo, para simplificar), não custa lembrar, neste 1º. de Abril, o quanto estas imagens podem ser mentirosas.
Algum tipo de manipulação sempre há, em qualquer fotografia, escolhas têm que ser feitas... Pode ser por parte do fotógrafo, ao escolher o ângulo ou a lente, ou do editor, quando opta por uma foto em vez de outra ou acrescenta uma legenda tendenciosa, entre outras figuras e possibilidades. De fato, a fotografia não é necessariamente um “espelho dos fatos”...
A primeira publicação, no Brasil, a imprimir fotografias de forma mecânica (sem intermediação de um gravurista) em edições sucessivas foi a Revista da Semana, lançada em maio de 1900.
As fotografias “realistas” impressionavam, mas os editores também apelavam, talvez contando com a ingenuidade dos leitores, poucos acostumados com fotografias... No n° 6, de 24 de Junho, a foto “Tentativa de Assassinato”, uma evidente encenação, ocupava toda a capa, enquanto a legenda, um tanto exagerada, dizia: “O coronel Horacio de Lemos atacado em pleno dia na Rua dos Ourives. Photographia instantanea apanhada casualmente por um dos nossos photographos”...
Outro recurso usado em certas circunstâncias (queda de vendas, em especial...) é a, digamos, “invenção da realidade”. Foi o que aconteceu em maio de 1952, quando a revista O Cruzeiro (que tinha em seu histórico alguns casos assemelhados), publicou as primeiras fotos de OVNIs do Brasil, em um encarte "Extra", sob o título "Disco Voador na Barra da Tijuca"!
Curiosamente, os ufólogos são gratos à reportagem porque, objetivamente, apresentou o tema aos brasileiros: “A ufologia no Brasil começou com uma grande fraude”. Ironicamente, oficiais da Força Aérea Brasileira (FAB) investigaram e produziram um relatório que confirmava a autenticidade das imagens, que são apenas fotomontagens.
Outro recurso usado em certas circunstâncias (queda de vendas, em especial...) é a, digamos, “invenção da realidade”. Foi o que aconteceu em maio de 1952, quando a revista O Cruzeiro (que tinha em seu histórico alguns casos assemelhados), publicou as primeiras fotos de OVNIs do Brasil, em um encarte "Extra", sob o título "Disco Voador na Barra da Tijuca"!
As fotos são de Ed Keffel e texto de João Martins, que até aparecem na revista, examinando os negativos das fotos, feitas em uma Rolleiflex. Um sucesso nada modesto... Diz a reportagem: "O Cruzeiro apresenta, num furo jornalístico espetacular, a mais sensacional documentação jamais conseguida sobre o mistério dos discos voadores. O estranho objeto veio do mar, com enorme velocidade, e foi visto durante um minuto, de cor cinza-azulado, absolutamente silencioso, sem deixar rastros de fumaça ou de chamas. Relato completo da fascinante aparição na Barra da Tijuca".
Curiosamente, os ufólogos são gratos à reportagem porque, objetivamente, apresentou o tema aos brasileiros: “A ufologia no Brasil começou com uma grande fraude”. Ironicamente, oficiais da Força Aérea Brasileira (FAB) investigaram e produziram um relatório que confirmava a autenticidade das imagens, que são apenas fotomontagens.
A polêmica correu mundo, mas, a revista Ciência Popular, que logo duvidara, declarou oficialmente, em sua edição nº 76 (janeiro de 1955), que as fotos eram falsas. João Martins ainda voltou a se defender, em O Cruzeiro (outubro de 1959), no artigo “Revelado o segrêdo da Barra da Tijuca”, até que uma autoridade, o diretor da Ground Saucer Watch, William H. Spaulding, garantiu, em 1981, que as fotos eram forjadas porque “havia divergência nas sombras”.
Em compensação, a fotografia pode exercer importante papel para restituir a verdade e isto parece mesmo muito mais importante, como nas perícias e quando denuncia farsas...
Em compensação, a fotografia pode exercer importante papel para restituir a verdade e isto parece mesmo muito mais importante, como nas perícias e quando denuncia farsas...
Em 1989, Brasil e Chile se enfrentavam num Maracanã lotado, pelas eliminatórias da Copa do Mundo da Itália, e, em caso de derrota, a seleção brasileira seria eliminada.
Aos 24m do segundo tempo, Brasil vencendo por 1 x 0, a torcedora Rosenery Mello do Nascimento, 24 anos, disparou um sinalizador, de uso naval. A chama atingiu o gramado muito perto do goleiro chileno Roberto Rojas, que se jogou no chão e simulou ter sido atingido. Os chilenos se retiraram do campo revoltados, o goleiro, ensanguentado, sendo carregado. O juiz argentino Juan Lostau encerrou a partida após aguardar os chilenos por 20 minutos. Imagens de TV e especialmente uma foto de Jorge William provaram que o sinalizador não atingiu o goleiro, o qual levara a campo uma lâmina escondida na luva, com a qual, ao cair, cortou o próprio supercílio, o que foi confirmado pelos exames de corpo de delito, que também não encontraram vestígios de pólvora (veja vídeo). A fotografia, intitulada “A farsa chilena”, deu a Jorge William o Prêmio Esso de Informação Esportiva de 1990.
Aos 24m do segundo tempo, Brasil vencendo por 1 x 0, a torcedora Rosenery Mello do Nascimento, 24 anos, disparou um sinalizador, de uso naval. A chama atingiu o gramado muito perto do goleiro chileno Roberto Rojas, que se jogou no chão e simulou ter sido atingido. Os chilenos se retiraram do campo revoltados, o goleiro, ensanguentado, sendo carregado. O juiz argentino Juan Lostau encerrou a partida após aguardar os chilenos por 20 minutos. Imagens de TV e especialmente uma foto de Jorge William provaram que o sinalizador não atingiu o goleiro, o qual levara a campo uma lâmina escondida na luva, com a qual, ao cair, cortou o próprio supercílio, o que foi confirmado pelos exames de corpo de delito, que também não encontraram vestígios de pólvora (veja vídeo). A fotografia, intitulada “A farsa chilena”, deu a Jorge William o Prêmio Esso de Informação Esportiva de 1990.
O Brasil foi declarado, pela FIFA, vencedor do jogo pelo placar de 2 x 0, pelo abandono de campo da equipe chilena. A então estudante Rosenery, torcedora do Fluminense, virou celebridade: deu entrevistas, foi a programas de tevê, esteve no Jô Soares e chegou a posar para a Playboy, em novembro de 1989. Tudo isto (vide site Achix) lhe rendeu casa e carro novo e viagens, até que ela “se aposentou”, casou e virou dona de casa...
Em suma, há falsificações, fraudes e farsas de todos os tipos na história do fotojornalismo e na imprensa... E, muitas vezes, o fotojornalista faz o seu melhor, “corre atrás”, mas, como a fotografia é "neutra", a sua colocação nestas histórias acaba dependendo muito mais do veículo de comunicação e das suas relações com as instâncias de poder.
Como no caso da foto de Evandro Teixeira, feita na madrugada de 1º de abril de 1964, na tomada do Forte de Copacabana por tropas do golpe militar que se autoproclamou “Revolução de 31 de Março”: “Nessa noite, o telefone tocou na minha casa, do outro lado da linha estava o capitão Leno, meu amigo de vôlei de praia, dizendo que o Forte estava sendo tomado. Peguei a minha Leica e fui para lá. Com a ajuda do capitão, consegui entrar com a máquina escondida por debaixo da camisa e dessa maneira pude fotografar a movimentação dos militares debaixo de uma chuva torrencial. Até pensaram que eu fosse fotógrafo do Exército Brasileiro! Pouco depois, o general Castello Branco chegou e senti que era hora de deixar o recinto”.
Fonte: Image & Vision.
Fonte: Image & Vision.
E já que estamos falando de variadas forma de mentiras, enganos e engodos em torno deste momento (leia mais no link), é sempre bom lembrar as manchetes de alguns jornais bem em cima do golpe...
14 comentários:
Aguinaldo,
fazia tempo que eu não espiava o seu blog, está excelente.
Tema interessantíssimo, Guina!
Muito bom mesmo o seu trabalho, Guina. Não spo aborda a fotografia histórica, mas tb outros aspectos, como é o caso da imprensa em peso saudando o golpe de 64. Não fosse vc cientista social, não é?
Por que vc não põe no facebook? O Fernando Rabelo posta toda novidade que ele coloca no blog, é legal. Divulga bem o trabalho.
bjs,
Cláudia
Muito bom seu comentário, Cláudia.
Eu já fiz dois "status" no Facebook sobre esta postagem, como tb fiz sobre anteriores. Fica dependendo do acesso dos amigos e de curtirem e comentarem lá (se vc puder fazer isto, ajuda...).
O caso do Fernando é diferente, o blog dele tem outra estrutura. Ele faz uma postagem por dia, em cima de uma única foto ou assunto. No meu, encadeio várias fofos em cada postagem (e tema), e são semanais. Daí, as dele aparecem 7 vezes mais que as minhas...
Valeu a solidariedade!
Bjs,
Guina
Caro Guina,
como sempre, o blog está muito bom.
Uma aula de jornalismo. Passo sempre aqui para aprender um pouco mais.
Gde ab.
PS: Essa nota é campeã. Não é toda hora, que um post tem comentário da Cláudia e do Claudio, ambos Versiani.
É um privilégio!
Esta ala comunicacional e comunicativa da família Versiani é que é campeã: a Cláudia, cientista social, colega do IFCS, jornalista, escritora, professora de Jornalismo na PUC; o Claudio, profissional, pensador e divulgador do fotojornalismo, de “Belzonte” a Brasília, Nova York, Barcelona, o mundo!
E a dupla (primos, parentes distantes?...) carimbando (oba!) minhas figurinhas!
Querido Guina 1 (e único)
A "verdade histórica" é de fato complicada.
Em minhas andanças já ouvi a mesma situação social em várias versões, e, o pior, a mesma pessoa já contou e mesma história em duas versões diferentes em épocas diferentes.
Estou acompanhando entrevistas com repórteres famosos s/ uma ocorrência policial, onde as versões são conflitantes. Cada um conta a "sua verdade", e foi um caso em q/ várias pessoas morreram.
Participei de um debate há uns meses atrás em q/ desmenti a tese em que nunca haviam sido usados blindados em invasões de morros.
Sempre (ou muitas vezes foram usados). As "otoridades" sabem
q/ a memória é nenhuma e isso é uma das velhas táticas p/ apagar o q/ interessa. De fato há muita manipulação.
Tenho [fotos] a "prova provada" do uso de blindado em morro e no alto do Morro do Alemão em 1994/95, feita p/ Agencia Estado, e tem outras.
Parabéns muitos pelo Blog
abs Alcyr
Tem toda razão, Alcyr,
é difícil afirmar uma "verdade histórica": nunca se sabe se se sabe tudo que envolve a história...
Realmente, a "primeira vez" é sempre um fator histórico marcante, como é o caso do seu exemplo. Mas, tb pode ser relativizado por conta da "efetividade" da ação, que poderia ser um argumento a favor de dar mais "valor histórico" aos eventos recentes lá do Alemão. A ironia é que não sabemos por qto tempo e de que maneira esta "efetividade" se manterá. E aí, pode ser que a História tenha que ser recontada...
Fala Aguinaldo
creio que não tenho a acrescentar. O tema daria um belo debate.
De qualquer forma, o repórter-fotográfico deve procurar não influenciar a situação (a cena), afinal a vida e o que acontece em volta pode ser mais importante que a arte.
Afinal lidamos com a verossimilhança (às vezes)....
Abs fraternos, Alcyr
E dia 27/04 faremos a primeira
projeção do ano.
Espero você.
DIA DA MENTIRA
Primeiro de abril é o dia da mentira, mas a VERDADE não tem o seu dia. A celebração está deslocada porque esse é o dia que se mente menos, uma vez que as mentiras são falsas, ao passo que nos outros dias é provável que as mentiras sejam verdadeiras. Para que não sejam desmascaradas pelo Esplendor da Verdade.
Deveriam constituir o dia da verdade. Poderia ser em 29 de fevereiro, para os políticos terem a chance de dizer a verdade a cada 4 anos.
Um grande abraço de verdade, Ronaldo Theobald
Caro Aguinaldo
a versão que eu sei das fotos do "disco voador" é diferente. Pelo que li em algum lugar, o Keffel e João Martins (pai do Franklin) fizeram um disco de madeira compensada, que foi lançado do alto da montanha, para o fotografo enquadrar debaixo. Ou seja, o disco era falso, não a foto em si. É possível esclarecer isso? Aliás, ja sugeri ao Ruy Castro que fizesse um livro sobre a revista O Cruzeiro. Acho que seria sensacional. Já existe um, mas parece que é muito ruim.
Um grande abraço do seu amigo
RM
Amigo Guina, muito bom o artigo sobres as fotos, a que me impressionou , não a conhecia, a foto noturna da soldadesca no Forte Copacabana, parece coisa de Cartier Bresson, pura arte, a chuva , a luz , o ambiente, obrigado pelo presente para nossos olhos, e olha que eu era aasíduo leitor da revista Realidade, Senhor e outras, mas esta foto, juro,desconhecia. Abção.
Carlos Alberto (Finfa)
Meu caro Rubem,
desculpe a demora da resposta.
Não me prendi muito à técnica de "fabricação" do disco voador, mas acredito que o pessoal de O Cruzeiro fez uma montagem de imagens no laboratório fotográfico.
Esta hipótese justificaria a afirmação do especialista americano de que “havia divergência nas sombras”. Possivelmente o disco (ou prato?) foi fotografado antes, para ser rapidamente inserido nas fotografias feitas na Barra (pelo método do chamado "sanduíche" de negativos ou por dupla exposição sobre papel, tudo refotografado, suponho).
Não é minha especialidade, esclareço, mas acho que, para maior precisão, deveriam inverter a ordem: primeiro, fazer as fotos do ambiente; depois, com a mesma angulação de luz, a do objeto.
Se quiser saber mais, abra os sucessivos links a partir do meu texto, que o pessoal da Ufologia esmiuçou a história de cabo a rabo.
Grande abraço,
Aguinaldo
Carlos Alberto,
esta foto foi publicada sem muito destaque pelo JB, numa página interna, junto com outras dos acontecimentos em torno do golpe de 64. O autor é um dos melhores fotógrafos brasileiros, Evandro Teixeira. Com o tempo, foi ganhando destaque, pq é mesmo uma bela foto e tem uma bela história. Não por acaso, virou capa do livro "A imprensa na História do Brasil"...
Postar um comentário