O 1º de Maio é certamente um produto de importação...
É referência à data da greve operária pela jornada de trabalho de oito horas, em Chicago, Estados Unidos, 1886, conhecida como Revolta de Haymarket. A repressão da polícia causou a morte de vários trabalhadores e alguns líderes ainda foram condenados à morte. A data foi transformada em símbolo de luta e é o Dia do Trabalho pelo mundo a fora, exceto nos E.U.A e poucos outros países...
No Brasil, passa a ser considerada a partir do início do século XX, com a chegada de imigrantes de origem urbana, especialmente italianos e espanhóis, incluindo lideranças socialistas e anarquistas.
A primeira greve nacional, em 1º de Maio de 1907 – Revista Ilustração Brasileira, SP |
São eles que comandam as primeiras agitações e protestos, reivindicando jornadas de oito horas (em vez de 13h), proibição do trabalho de menores de 14 anos, fim da jornada noturna para mulheres e menores, congelamento do preço dos alimentos e aumento salarial. O auge desta série de movimentos ocorre durante a I Guerra Mundial, com as greves de 1917 em São Paulo e Rio de Janeiro; a greve da Cantareira em Agosto e a Insurreição Anarquista em Novembro de 1918, no Rio; e as grandes greves de 1919, em vários estados (leia mais aqui).
Getúlio Vargas nas mãos dos trabalhadores, 1942 |
Nos tempos de Getúlio, após a instauração da ditadura do Estado Novo, em 1937, os trabalhadores são cooptados pelo “trabalhismo” não socialista, através da propaganda e da instituição de novos direitos trabalhistas. Até o malandro muda, quer ser trabalhador... O samba de Wilson Batista e Ataulfo Alves, de 1941, o "Bonde de São Januário", em sua versão oficial, forçada pelas pressões do momento, diz que o bonde leva “mais um operário/sou eu que vou trabalhar” (veja a história aqui). O título é uma evidente referência ao estádio do Vasco da Gama, local das comemorações do 1º. de Maio durante o Estado Novo, local, inclusive, da assinatura da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) por Getúlio Vargas, em 1º. de Maio de 1943.
A partir daí, o Dia do Trabalhador deixa de ser considerado um momento de protesto e crítica às estruturas sócio-econômicas, com seus piquetes e passeatas, e passa a ser um dia de comemorações e de celebração, com festas, desfiles, predominando, mais recentemente, os grandes shows de artistas populares e sorteios de automóveis e até casas...
Mas, ao menos em dois importantes momentos, este caráter dispersivo é substituído por eventos da maior relevância...
Lula fala em assembleia no estádio e a presença de fotógrafos, 1980 |
Em 1978, as lideranças sindicais aproveitaram o 1º. de Maio para preparar a greve do dia 12, de mais de 3.000 metalúrgicos da Scania, em São Bernardo, SP, dez anos após a anterior, em 1968, do ano da imposição do AI-5. O movimento cresce, sustenta greves em 78 e 79 e sofre intervenção do governo em 1980, com a prisão de Lula e outras lideranças. Estas greves dão estímulo ao processo de reforma partidária (quando surge o PT, o Partido dos Trabalhadores) e impulsionam o processo de redemocratização do país, que resultará na campanha pelas Diretas Já, de 1985.
Atentado no Riocentro - Aníbal Philot, 1981 |
Em 1981, no Rio de Janeiro, estava previsto que o evento principal seria, mais uma vez, um show de artistas populares... O espetáculo ficou por conta de militares radicais do Exército, ao falharem no chamado atentado do Riocentro. Dentro de um Puma, com uma bomba no colo, morreu um sargento, enquanto no banco do motorista jazia um capitão gravemente ferido. A tentativa de acusar organizações de esquerda ajudou a desacreditar os governos militares e a apressar (?) a democratização.
Dirigentes da CUT e Danny Glover - Danilo Ramos, São Paulo, 2011 |
Em 2011, após tantos anos de esvaziamento da luta, enquanto as centrais sindicais competiam pelo show ou sorteio mais produtivo, quando até mesmo o salário mínimo já não lhe está mais vinculado, a data tem ao menos um novo ingrediente...
Com a presença do ator norte-americano Danny Glover, filho de sindicalistas, a festa da CUT, em São Paulo, colocou foco na relação entre Brasil e África e na participação nesta luta dos negros brasileiros.
Escravos numa plantação de café - Marc Ferrez, c. 1882 |
Não chega a ser uma volta ao passado, mas nunca é demais lembrar (e reconhecer e reverenciar): os muitos trabalhadores negros do Brasil de hoje, continuamente desmerecidos nas relações trabalhistas, descendem justamente dos escravos, os trabalhadores fundamentais na construção do Brasil.
6 comentários:
Acho o nome deste site meio confuso... poderia explicá-lo?
Tem toda razão, Paulo.
A ideia original da postagem, simplificadamente, era comparar a fase inicial (das greves e fotos PB) com a fase mais recente (dos shows e fotos coloridas).
Aí, apareceu na pesquisa esta nova ligação com a África, o que me trouxe a fundamental associação com a escravidão.
Por razões práticas, mantive o título, que, apesar do desvio no tema, ainda me parece fazer sentido.
E, afinal, um pouco de estranhamento serve chama atenção...
Muito interessante, Guina!
Golaço teu, como outros.
Abraços fraternos do Marcos
ACESSEI O "SITE" DO DEPUTADO ESTADUAL CARRION DO R. G. DO SUL e fiquei besta com a quantidade de informações sobre a história dos partidos anarquistas e comunistas do Brasil.
Quando digo fiquei besta, entenda: mais besta ainda... ah, ah
Voltando à vaca fria: EU NÃO SABIA QUE HOUVE TANTOS PARTIDOS, GRUPOS ETC. COMUNISTAS E ANARQUISTAS NO NOSSO INCULTO PAÍS! AFINAL, então nem tudo está perdido...
Guina,
Parabéns.
Obrigado e valeu!!!!
A seleção é substantiva, artística e sensível para essa memória tão valiosa de nossas vidas comuns geracioanais. Me tocou fundo!
Abçs,
Aninha Motta
Eu, como ex assessora de imprensa, sempre penso na divulgação. Outro dia assisti, no Observatório da Imprensa, a uma ótima entrevista com o autor da novela Amor e Revolução - acho que o nome dele é Tiago Santiago. Po que vc não tenta divulgar seu trabalho lá? Seria uma ótima pauta, a meu ver.
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